já tinha postado no Sabedoria, mas...
O tempo pára enquanto anita segura o jornal
O jornal aberto em espelho
Não mostra um trem descarrilhado
Milhares de mortos, uma criança perdida
É o caderno cotidiano
Os benefícios da reciclagem
E uma nota no canto esquerdo
O marido de anita está fora
Ele anda na rua e não sabe
Na coleira vai Rodolfo, nariz úmido colado ao chão
O cão pára frente ao sinal
Na rua ele não é um cachorro
É um soldado, uma enfermeira, um pai amoroso
Não há tempo para postes e latas de lixo
Não há tempo para latir para o carroceiro que passa
Há que se levar este homem que não enxerga para casa
Esse homem que leva ovos e leite e lhe dará um biscoito quando chegarem
Quando ele poderá se coçar e ser um cachorro
Anita não decora a casa há anos
Nada jamais muda de lugar
A banqueta um pouco à direita é um tropeção
Uma porta inadvertidamente aberta, um hematoma
Cada coisa em seu lugar e é como se Rubens enxergasse
10 passos entre a porta e a cozinha
escova de dentes: 1 palmo à esquerda da pia
E por isso a casa idêntica por pelo menos 20 anos
O mesmo perfume há 30
Rubens e o cão no elevador
Um signo de pontinhos: terceiro andar
São 10 passos até a cozinha, um biscoito
Uma nota na página esquerda
Caderno cotidiano
Desimportante
Um perfume que sai de linha
Uma fragrância que não mais se fabrica
O único rosto que um marido conhece
O mesmo cheiro dos lençóis, dos travesseiros
Que a três passos adentro da porta diz:
Anita já chegou
Anita está na cozinha
Anita está na sala e come pipocas vendo televisão
Anita que será uma estranha
Ao fim de dois dedos
Dentro de um vidro
sobre a penteadeira
3 palmos à esquerda de uma caixa de bijuterias
a 20 cm do espelho
a 1 metro e meio
do chão.
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