sábado, julho 16, 2011

paredrices

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Amor


O amor é um jardim decorado com canteiros de corações partidos onde vivemos nossas incríveis estórias. Aventuras irresponsáveis que ressuscitaremos em nossos travesseiros pelo próximo milhão de noites. Pequenos suicídios emocionais, overdoses de arrebatamento, angústia, orgulho.

(Quando seus lábios encostam-se aos meus, eu penso nela. Mas sempre que ela se aproxima de mim, eu lembro de você.)

Escolhemos a confusão, nos perdemos numa mata de meias-palavras. Lembranças duvidosas, olhares de viés, promessas que jamais poderemos cobrar.

(Você trespassou o coração do meu coração como uma adaga renascentista. Eu preparei este sonho para você, mas você devorou a minha mão.)

O tempo foge e de repente é a vertigem: longe demais para chegar, muito para tentar entender, muito tarde para mergulhar. O lago secou.


(Vem a madrugada e o mundo é um borrão de fracassos úmidos. Eu volto ao conforto da montanha, meu útero freudiano no meio da floresta.)

Então nos recolhemos e aceitamos nosso papel. Somos mártires sacrificados em nome do amor. Sangramos o enredo da nossa estória, a mais triste jamais contada. Cultuamos nossa dor, procuramos a redenção. Como um epitáfio para o sonho destruído, um exorcismo, um grito lancinante.

(Porque todo o amor que sou capaz de roubar, pedir ou emprestar, não basta para aplacar essa dor. O que é o amor? Apenas um prelúdio para a tristeza. Seu objetivo é construir os verdadeiros silêncios)

Trágico é aquele que anda pelas colinas e olha atrás de si o paraíso perdido. Não tem mais nada, não é mais nada. Quer obrigar o mundo a aceitar suas lágrimas, engolir seu silêncio. O mundo tem mais o que fazer. O sol brilha. As flores são belas.
O amor é patético.


. . .
*


A cidade vazia, todo mundo vivendo o verão em altitudes distantes.
A lua pendurada no céu como filme saído de um velho projetor.


Silêncio terrível a noite que começa.


Resolvo fazer café para mim mesmo e exagero a quantidade.
Acabo bebendo tudo porque sempre lembro o quanto você odeia desperdícios.
Essa noite imensa, vagando pela casa como menino perdido no supermercado.


Um astronauta poderia ter visto a tristeza em meus olhos, lá do espaço.


Lembre-se de lembrar de mim
em algum lugar do seu passado
flutuando como um beija-flor.


. . .
*


Enquanto você dormia
brilhava a lua sombras se moviam
tocou o telefone voou o tempo
na cozinha estrilavam pequenas melodias.

Você tossiu, se virou
murmurou pequenos segredos de outras realidades .
Lá fora governos caíam, estrelas viravam poeira.
você dormia e ignorava o universo.

Gigantes brigavam do outro lado do mundo;
máquinas rugiam mas sem nos ameaçar
a terra suspirava,
através dos ventos você dormia.
eu tossi, me virei
até fechar meus olhos
para as pressões do futuro.

Enquanto você dormia,
as horas mudavam
e a gravidade tornava meu amor quase abissal.
Cheia de sonhos você dormia
e seu calor bastava prá tudo estar bem.
Eu andei na ponta dos pés, banheiro cozinha copo d´água.
Meu coração batia alto,
minha mente acesa demais.

Seu rosto assumia contornos
mistérios em preto e branco
e lá fora choveu por meia hora
e eu pensei em filmes
lembranças
campeonatos
praias
lugares onde poderíamos ir
esperei que a manhã
viesse prá dissolver tudo isso.
Você teve o sonho mais estranho antes de acordar
fitou o teto com olhos vazios
voltou ao mundo e sorriu prá mim.


. . .
*



Vai, pára um pouco de sonhar e diz alguma coisa bonita a ela, é preciso fazer alguma coisa, olha quanta inquietação, as mãos se agitando, o rosto dramático, tanta angústia, ela e essa angústia pelo que não faz sentido e não pode, só você sabe o quanto ela deseja errado, chora errado, quer aquilo que não tinha nada o que existir nesse cenário de olhos brilhantes e a boca que espera que você a convença que tudo está bem, que vai dar certo, este certo que ela quer e você não, que você sente que é a coisa mais errada de todas que poderiam ser

e então você respira fundo e vai e cria um outro plano onde nada disso é importante, onde ela é a rainha com tudo o que tem de fascinante e que é tão ela e os planos que vão sim dar certo e vai ser o sucesso, e ainda vamos olhar lá no futuro e rir desse agora pequenino que era só dúvida e temor

e por quinze minutos você a traz para o sonho que é seu e agora ainda mais bonito porque compartilhado na troca de sorrisos ah tão perfeita, e seu sorriso ainda paira no ar um instante a mais, o momento ridículo em que você ainda está ali e ela novamente dentro da realidade, as coisas a fazer, quem sabe mais uma vez reconquistar as simpatias dessa coisa velha que ressurge e se esparrama pesada sobre os últimos fiapos do sorriso

e você já não quer, já não sabe dizer mais nada, na janela está escuro e que bom que o dia é feio, que suas respostas agora são feias, que você é legal mas de repente fica assim muito estranho, não sei o que acontece mas ok, prá que arrumar ainda mais confusão, né ?

Tchau, a gente se fala.


. . .
*



Depois de um punhado de dias em que o sol
é rotineiramente arremessado e depois afunda de novo,
é difícil ver sentido na pequeneza das coisas.
A vida é um pouco como essa semana;
os começos cada dia mais distantes,
a qualquer momento começam os finais.
Quinta-feira.
Sempre a sensação de borbulha quase explodindo,
de vai-ser- agora.
Momento tão desarrumado, cheio de ecos
do passado que correm e se misturam com as expectativas do futuro.
Dias inquietos como crianças no escorregador.


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Gil Brandão - meu paredro

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Um comentário:

Lubi disse...

gil, você é foda.
extremamente habilidoso com as palavras.