Sentado no vaso sanitário
(último refúgio de tranquilidade
no moderno mundo hiper-vário)
vejo no azulejo a aranha.
Dessa de perna fina,
indefesa e pequenina.
Tinha quatro pernas apenas.
(deveras, um probema!)
Pra aumentar a estranheza
três delas à sua direita
e à esquerda apenas uma.
E se equilibrava, assimétrica pluma,
entre as semi-retas sem esquadro dos rejuntes.
Aranha transeunte.
Resisto à imediata propensão ao esmagamento
que me acomete
sempre que uma aranha me cruza o carpete.
Analiso com comedimento
como é que uma aranha se porta
sem quatro pernas, desalinhada, toda torta.
O mais estranho em todo o quadro
é que a terceira perna de um dos lados
se estendia à frente antes do passo.
Tateava antevendo o chão vindouro,
como uma tacanha antena,
como que em busca de um tesouro.
E seguia a aranha, em círculos minúsculos,
quatro pernas apenas,
metade de seus músculos.
Será que uma aranha entende de poesia?
Haverá nos aracnídeos
algo que os diferencia?
Cansado da simpatia
- brincadeira tão infantil -
esmago de uma vez, sem senões,
aranha e divagações.
Afinal, não posso perder um minuto.
Sou do banheiro
o rei absoluto.